Originalmente publicado em 05/05/2014
As mídias audiovisuais abordam as cores além de seus conceitos estéticos. Breaking Bad é um exemplo recente de como o criador, Vince Gilligan, resolveu se preocupar com o comportamento psicológico das cores.
Fizemos isso em pequena escala no episódio piloto: foi intencional que Walt começasse com bege e khaki, muito tímido, e ele iria progredir através dessa uma hora de episódio para o verde e mostraria seu processo de evolução como personagem. Começamos a fazer isso em larga escala durante grandes períodos da série: Walt começaria, por exemplo, em um ano de vermelho e seria levado para o preto.
Vince Gilligan em Entrevista ao GQ.
Outras obras têm esse cuidado com as cores, seja minuciosamente ou não. O escritor Robert Mills, tem um ótimo texto sobre o poder narrativo das cores nos filmes, citando obras recentes e antigas com exemplos.
Como um estudante de design gráfico, é interessante entender a carga de significados diferentes que as cores carregam. Uma mesma cor pode significar coisas diferentes em contexto diferentes. Em algumas culturas o branco é utilizado em luto, na África do Sul por exemplo utiliza-se o vermelho, trazendo o significado de morte e agressão.
Utilizar esses conceitos fornece uma camada a mais de aproveitamento, chamando atenção daqueles mais atentos aos detalhes. Dá um novo sentido a obra, uma vez que os significados sejam entendidos.
The Last Tinker: City Of Colors me surpreende pela maneira como apresenta tais conceitos. O mundo das cores é a sua principal temática, deixando isso claro logo de início.
As cores primárias, verde, vermelho e azul, viviam em harmonia, mas ao passar do tempo acabaram criando aversão entre si, levando a uma segregação por distritos. Apenas no Distrito Exterior é onde encontra-se a paz entre as cores.
Não existe segregação no Distrito Exterior, as três cores se encontram em todos os lugares seja de maneira uniforme ou não, transmitindo a ideia de que funcionam bem juntas. Isso também é perceptível no design dos moradores do Distrito, são todos coloridos, assim como o protagonista Koru.
O uso excessivo de cores no cenário não incomoda, ele consegue apresentar esse universo colorido sem confundir o jogador é curioso notar pequenos detalhes dentro dos distritos das cores primárias. O verde por exemplo, é cheio de armadilhas e câmeras de segurança remetendo ao medo que os habitantes de tal área tem em relação ao resto da cidade.
A cidade das cores (colortown) é um ambiente extremamente convidativo, você se sente motivado a conhecer cada pedaço oferecido.
Isso conversa bem com a navegação de Koru. Assim como em Assassin’s Creed, navegamos pelo cenário apenas segurando um botão e o personagem pula automaticamente, em alguns momentos é prazeroso pular e realizar acrobacias, em outros é apenas frustrante. De primeiro momento seus movimentos são precisos e tudo parece funcionar bem até que percebe que o jogo não lida bem com acrobacias mais delicadas e tudo não se passa de uma grande ilusão.
Koru parece não ter senso de direção e nem peso. Poucas vezes você consegue senti-lo ao navegar pela cidade e é quase inexistente no combate. Utilizando a ideia base de Batman Arkham Asylum, no combate você vai pulando de inimigo a inimigo é simplesmente qualquer coisa. Não possui profundidade alguma e a falta de peso de Koru o deixa desinteressante fazendo com que suspire um “de novo? sério?” a cada luta.

Mesmo utilizando os poderes únicos de cada cor, lutar contra os inimigos vira uma tarefa medíocre.
Fora das lutas os poderes funcionam muito bem. A interação se dá através do carismático Biggs, o cogumelão amarelo abobalhado. Sua presença no jogo resulta em pequenos puzzles bem sacados.
Ao acertar Biggs com o vermelho por exemplo, faz com que fique com raiva e comece a bater no chão. No caso é utilizado para pressionar botões que ativam portas para lugares fechados. A versão reduzida de Biggs, o Bomber também reage de maneiras diferentes. Com o vermelho ele apenas explode, quebrando paredes e até ajuda em algumas lutas.
Sua maior qualidade é como representa de formas variadas a mesma cor. Vermelho representa força e coragem. Verde representa rapidez e curiosidade. Azul representa força moral e sabedoria.
Com o passar do tempo, Vermelho vira raiva, Verde vira temor e azul vira melancolia.
Ele constantemente passeia por tais significados. Seja pelas interações com Biggs, pela porradaria ou pelos poderes especiais, as cores representam coisas diferentes em diferentes contextos.
Tais cores são representadas por espíritos, entidades que carregam em si o verdadeiro poder de cada cor. São os personagens mais carismáticos e divertidos, através deles conseguimos perceber claramente a dualidade de significados.
The Last Tinker é aquele seu amigo criativo que de vez em quando fala algumas coisas interessantes e embora cometa algumas vacilações, no final elas não incomodam tanto. Já que afinal, ele é seu amigo.